O tamanduaí (Cyclopes didactylus) é a menor e menos conhecida espécie de tamanduá do mundo. Inicialmente, foi descrito como parte da Família Myermecophagidae, junto com as outras três espécies de tamanduás (Myrmecophaga tridactyla, Tamandua tetradactyla e Tamandua mexicana); porém, há pouco tempo, foi classificado dentro da Família monotípica Cyclopedidae, ordem Pilosa.
Esta é uma espécie muito interessante, entretanto, existem poucas pesquisas sobre o tamanduaí devido principalmente da dificuldade de achá-lo em seu habitat natural, uma vez que se trata de uma espécie solitária, de tamanho reduzido, noturna e que habita principalmente os estratos mais altos da floresta, recentemente pesquisadores do Instituto Tamanduá descreveram seis novas espécies, sendo 3 exclusivamente brasileiras.
O indivíduo adulto mede cerca de 35 cm e possui uma cauda de 20 cm, pesando cerca de 300 gramas, externamente apresenta uma pelagem sedosa de pelos curtos e lisos de coloração que varia do amarelo ouro até uma cor amarronzada ou mesmo acinzentada. É o mais noturno e o mais arborícola dos tamanduás, possui olhos negros e pequenos e um focinho mais curto que os demais tamanduás.
A distribuição desta espécie estritamente arborícola abrange as florestas tropicais em uma ampla área que inclui o sul do México, América Central (exceto El Salvador), e a América do Sul, desde o nível do mar até uma altitude de 1.500 m. Segundo pesquisas realizadas pelo Instituto de Pesquisa e Conservação de Tamanduás no Brasil, existe uma população isolada na região nordeste do Brasil, nos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Maranhão e Piauí.
Recentemente a população de tamanduaí foi dividida em população amazônica e uma subpopulação nordestina e pouco se sabe sobre as ameaças que acometem esta espécie. As mais significativas até o momento são: perda de habitat e uso como pet.
Para conseguirmos entender o que é um tamanduaí, como ele vive, como se reproduz, o que ele come e qual o seu comportamento natural, sua manutenção em condições controladas fornece uma oportunidade única para investigar vários aspectos da ecologia e biologia destes animais solitários, pouco estudados e que são difíceis de serem observados em seu habitat natural.
Além disso, por conta da aparência bem diferenciada dos tamanduás quando comparada com outras espécies de mamíferos, atrai bastante olhares curiosos quando são encontrados em jardins zoológicos, esta característica pode e deve ser aproveitada para realizar campanhas de sensibilização e educação ambiental com a finalidade de conservar as populações silvestres.
O estabelecimento de populações em cativeiro pode prover uma valiosa rede de segurança contra a extinção quando uma espécie atinge níveis críticos na natureza ou está sob risco de desaparecimento frente a eventos estocásticos, catástrofes ambientais ou perda de variabilidade genética. A decisão de implantação de um programa de conservação ex situ para uma espécie dependerá das necessidades e situação do táxon e não deve ser tomada apenas quando a espécie está em risco iminente de extinção.
O desenvolvimento de protocolos de manejo é importantíssimo para que boas práticas sejam disseminadas para outras instituições, para que desta forma se proporcione uma melhor qualidade de vida e bem-estar aos animais que eventualmente são resgatados, desta maneira aumentando as chances de sobrevivência e posterior reintrodução.
Com a intenção de estimular e desenvolver atividades de manejo, pesquisa e conservação da espécie, associando os esforços de conservação ex situ com os in situ, objetivando aumentar o nível de conhecimento existente acerca da espécie e promover melhora no seu status de conservação e proteção do seu habitat, foi proposto a criação de um programa de conservação ex situ de Cyclopes didactylus, a menor espécie de tamanduá do mundo e com 3 espécies endêmicas do Brasil.
A finalidade do projeto de conservação é adquirir, consolidar e difundir conhecimento sobre a biologia da espécie que é tão pouco conhecida, sua importância, sua manutenção sob cuidados humanos e melhorar seu status de conservação em seu habitat natural. Através do projeto será possível aprimorar as técnicas para manutenção sob cuidados humanos da espécie; receber animais provenientes de tráfico e resgates que, apesar de incapazes de retornarem à natureza, serão de grande valia para a reprodução e conservação e também fornecer animais que possam ser utilizados em programas de Educação Ambiental, para disseminar conhecimento sobre a espécie e garantir a sua conservação e de seu habitat natural.
O Zooparque Itatiba em parceria com o Instituto Tamanduá foi escolhido para ser a sede do primeiro Programa de Manejo ex situ de Cyclopes didactylus, sendo o responsável pelo recebimento, alojamento e manutenção dos indivíduos, mantendo um sistema compulsório de armazenamento de informações das espécies.
Com o objetivo de ampliar o conhecimento sobre a biologia e ecologia para o direcionamento de estratégias de conservação dos tamanduaís (Cyclopes didactylus).
As ações potenciais e objetivos ex situ serão avaliados juntamente com atividades potenciais in situ no processo de planejamento do programa de conservação para assegurar que sejam utilizados de forma adequada e para obter o melhor resultado, com isso, as duas instituições estarão envolvidas em todas as etapas do Programa assim como será buscado o envolvimento de órgãos ambientais federais e estaduais.
Os animais envolvidos no projeto serão provenientes do resgate de fauna, entregas voluntárias aos órgãos ambientais e do tráfico de animais, através de apreensões realizadas por órgãos competentes. Estes indivíduos serão reabilitados e incluídos na experiência de manejo.
Para início do projeto recebemos um indivíduo adulto macho que foi entregue na base do IBAMA no Delta do Paranaíba, PI, e devido ao seu quadro de saúde, foi encaminhado para a base do Instituto Tamanduá. Este indivíduo foi carinhosamente chamado de Yoyo, chegou à base em junho de 2021, já adulto. Estava bastante debilitado e muito provavelmente foi retirado da natureza para ser criado em cativeiro como pet. Mas quem o retirou de seu habitat não imaginava que seria tão difícil cuidar de um tamanduaí (Cyclopes didactylus) e o manejo inadequado deixou o animal extremamente magro e com um quadro severo de hipovitaminose e desidratação.
Para cuidar da espécie tão pouco conhecida, os pesquisadores do Instituto Tamanduá desenvolveram uma dieta diferente da dos demais tamanduás. Para isso o Instituto contou com o apoio da Lizette Bermudez, bióloga com experiência em manejo de tamanduaís, que por mais de 8 anos, trabalhou com 5 indivíduos no Parque Zoológico Huachipa, Peru e da Ana Raquel Gomes Faria, zootecnista e pesquisadora associada do Instituto, que possui muita experiência com a alimentação de tamanduás sob cuidados humanos. E, considerando o quadro de saúde do Yoyo, além de diferente, a sua dieta foi reforçada – hiperproteíca.
Todo o conhecimento adquirido em pesquisas com tamanduaís de vida livre, e o conhecimento aprendido com o Yoyo, irá gerar frutos para a conservação.
Com o manejo realizado, hoje o indivíduo está saudável e com o seu peso ideal, 285 gramas. Por ser o único de sua espécie em cativeiro no mundo, e, por ter se habituado à presença humana, comportamento não ideal em uma situação de vida livre, não seria ideal a sua reintrodução.
Por isso, o animal foi encaminhado para o Zooparque Itatiba, apesar de nunca ter manejado a espécie, a instituição possui ampla experiência no manejo de outras espécies de tamanduás (Myrmecophaga tridactyla e Tamandua tetradactyla) e se propôs a fornecer instalações e dieta adequada de acordo com os estudos já realizados para o indivíduo em questão.
Cada dado obtido com os cuidados deste indivíduo é extremamente útil, servindo de base para ações de conservação da espécie. Manter tamanduaís sob cuidados humanos é de extrema importância, caso seja necessário realizar programas de reintrodução futuramente.
Espera-se que com esse projeto possamos dominar as técnicas de manejo ex situ da espécie, conhecer mais a biologia deste pequeno desconhecido e assim contribuir também com os projetos de conservação in situ do Cyclopes didactylus.